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18 Janeiro 2021

Violência contra defensores e defensoras de direitos humanos nas favelas do Rio de Janeiro

Nos dias 12 e 13 de janeiro de 2021, durante operações policiais nas favela Santa Marta e no Complexo do Alemão, defensores de direitos humanos que têm denunciado o abuso e a brutalidade policial em suas comunidades foram alvo de violência, ataques físicos e tiveram suas casas e bens danificados.

Tandy Firmino é uma liderança da favela Santa Marta, e tem sua atuação marcada pela defesa dos direitos da população das favelas e comunidades periféricas do Rio de Janeiro. Na manhã do dia 12 de janeiro, policiais invadiram a casa do defensor de direitos humanos na favela Santa Marta, derrubando a porta durante o processo. A sua filha também estava em casa durante a incursão. A polícia não deu qualquer razão para invadir a casa do defensor. Este tipo de assédio é uma estratégia comum utilizada pela polícia para intimidar os defensores e defensoras de direitos humanos e membros das favela no Rio de Janeiro.

No dia seguinte, 13 de janeiro de 2021, durante uma operação policial no Complexo do Alemão, policiais militares confiscaram e destruíram o seu celular do defensor de direitos humanos e repórter Renato Moura, enquanto ele documentava as ações da polícia. O aparelho, um iPhone X adquirido a partir de doações, vinha sendo utilizado pelo coletivo Voz das Comunidades para documentar as violações de direitos humanos nas favelas do Rio de Janeiro. Os policiais ainda procuraram justificaram a agressão dizendo que “o Voz só fala mal da polícia para ganhar fama”.

A Front Line Defenders considera inaceitável que a Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro invada ilegalmente domicílios e destrua os pertences de defensores de direitos humanos e cidadãos. Infelizmente, esses acontecimentos não são fatos isolados, mas fazem parte de uma série de violações contra os moradores de favelas e bairros periféricos do Rio de Janeiro, onde as invasões de domicílios sem mandado judicial, os disparos contra pessoas desarmadas e a violência contra residentes são uma prática padrão e regular exercida pela polícia.

O assédio aos defensores de direitos humanos Tandy Firmino e Renato Moura são apenas dois exemplos da realidade da população negra no Rio de Janeiro. A discriminação racial seguida de atos de violência por parte da polícia é uma questão recorrente no Brasil e tem um impacto crítico na capacidade dos defensores e defensoras de direitos humanos negros de atuarem num ambiente seguro. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 79,1% das mortes em intervenções policiais são de pessoas pretas ou pardas, sendo que o Rio de Janeiro é o estado com a taxa mais alta de mortes em decorrência de violência policial. No ano de 2020, apesar das medidas de isolamento devido à pandemia da COVID-19, 775 pessoas assassinadas no Rio de Janeiro foram registradas como vítimas de intervenções policiais.

Na última semana, o Supremo Tribunal Federal (STF) e Procuradoria Geral da República (PGR) anunciaram a realização de audiências públicas em março e abril de 2021, com o objetivo de coletar informações para subsidiar o estado do Rio de Janeiro na elaboração de seu plano de redução da letalidade em operações policiais. As audiências também terão como objetivo auxiliar o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) a definir procedimentos para a fiscalização da atuação policial e dos órgãos do Ministério Público estadual (MPRJ).

Essas audiências estão inseridas nos marcos da ADPF das Favelas, também conhecida como ‘ADPF das Favelas’. A ação judicial, protocolada pelo ‘Movimento das Favelas’, em parceria com a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro e uma série de organizações da sociedade civil, obteve, perante ao STF1, a suspensão de operações policiais em favelas e bairros periféricos do Rio de Janeiro durante a pandemia da COVID-19. Até a presente data, o governo e a polícia do Rio de Janeiro deixaram de cumprir a medida em várias ocasiões. Esse descumprimento constata um padrão contínuo de violência e racismo na implementação da segurança pública do estado. Diante da falta de observância da suspensão das operações policiais, os defensores e defensoras dos direitos humanos continuam em sério risco de brutalidade policial; dada a natureza do seu trabalho e a sua proeminência e visibilidade nas suas comunidades, o que tem levado a que sofram o fardo da violência policial generalizada.

1Em 2020, o ‘Movimento das Favelas’, em parceira com a Defensoria Pública Estadual do Rio de Janeiro e uma série de organizações da sociedade civil propôs uma ação denunciando a violência policial ao Supremo Tribunal Federal (STF). A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 635 (ADPF 635), popularmente conhecida como “ADPF das Favelas” buscava reconhecer e remediar as sérias violações cometidas pela política de segurança pública do estado do Rio de Janeiro durante a pandemia da COVID-19. Embora a decisão do STF represente uma vitória da sociedade civil, as medidas legais dispostas ainda precisam ser efetivamente implementadas; o governo do Rio de Janeiro deixou de cumpri-las em várias ocasiões. Na ausência de implementação e dada a natureza do seu trabalho, os defensores e defensoras dos direitos humanos permanecem em sério risco de brutalidade policial; a sua proeminência e visibilidade nos bairros significa que é mais provável que sejam eles e elas os obrigados a suportar o peso desta violência generalizada.

A Front Line Defenders reitera a importância da responsabilização policial e do direito dos defensores de direitos humanos de monitorar e denunciar as violações dos direitos humanos cometidas pela polícia no Rio de Janeiro. A Front Line Defenders convoca as autoridades no Brasil a condenar a brutalidade policial nas favelas e comunidades periféricas, garantindo a efetiva implementação das medidas dispostas na ADPF 635. A Front Line Defenders reafirma a sua reprovação diante do contexto de violência policial no Brasil e do impacto desproporcional que o racismo e o policiamento discriminatório têm sobre os membros do movimento negro e os defensores e defensoras dos direitos humanos no país.

 

1 Em 2020, o ‘Movimento das Favelas’, em parceira com a Defensoria Pública Estadual do Rio de Janeiro e uma série de organizações da sociedade civil propôs uma ação denunciando a violência policial ao Supremo Tribunal Federal (STF). A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 635 (ADPF 635), popularmente conhecida como “ADPF das Favelas” buscava reconhecer e remediar as sérias violações cometidas pela política de segurança pública do estado do Rio de Janeiro durante a pandemia da COVID-19. Embora a decisão do STF represente uma vitória da sociedade civil, as medidas legais dispostas ainda precisam ser efetivamente implementadas; o governo do Rio de Janeiro deixou de cumpri-las em várias ocasiões. Na ausência de implementação e dada a natureza do seu trabalho, os defensores e defensoras dos direitos humanos permanecem em sério risco de brutalidade policial; a sua proeminência e visibilidade nos bairros significa que é mais provável que sejam eles e elas os obrigados a suportar o peso desta violência generalizada.